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quarta-feira, 13 de maio de 2009

Dois pesos, uma medida

Era uma tarde muito agradável e Estácio avisou à família que sairia para comprar cigarros. Só não contava encontrar a turma da pelada matinal por lá. Assim que Estácio entrou no bar, Lourival tratou logo de chamá-lo.


- Estácio, meu amigo! Há quanto tempo! O que está acontecendo com você, não vai mais pras peladas...


- É, realmente, muito tempo... Só que casei. Se lembra da Alzirinha?


- Alzirinha? Aquela que no colégio ficou com o Mateus, o Zé Pinguela, o Antoninho...


- ...E com o Paulo, o Mangaba e o Tadeu. A mesma. Pois é, dei em cima, cheguei junto e pimba! Bola sete na caçapa do meio.


- Mas como é que se deu isso?


- É o seguinte: sabe aquele forró que tinha lá perto de casa? Então, descobri que ela ia pra lá? Num belo dia, eu tava só, ela também, e chamei ela pra dançar. Ela topou, joguei um papo e... aí já viu, né?


- E o que é que rolou?


- Assumimos um rolo sério, eu com ela, tudo direitinho. O tempo foi passando, fizemos nossa casinha e juntamos nossos trapos.


- Pô, beleza! Mas o que rolou que tu sumiu lá da pelada? Vai me dizer que ela...


- É isso mesmo. Ela barrou! E tem mais: se ela descobrir, eu tô frito!


- Vamos deixar isso pra lá! Puxe uma cadeira e sente aqui com a gente. Garçom, mais um copo!


Ele queria fugir mas não conseguira. Lourival e os outros, que estavam à mesa, convenceram-no a ficar. Papo vai, papovem, eis que aparece Juninho, o filho caçula de Estácio, com mais três crianças (os filhos de Lourival).Sabendo que Juninho era o mais fofoqueiro de seus três filhos. Estácio começou a tremer. Seus amigos estranharam, principalmente Lourival.


- Que que foi, Estácio? Parece que viu assombração!


- Tá vendo aqueles três garotos vindo pra cá?


- Sim, são meus filhos com o Tacinho, o colega deles.


- Pois é, Tacinho é meu filho. Aliás, o mais caguete deles.


- Que isso! Ele é um excelente garoto, show de bola!


- Mas tem a língua solta que só.


- Tá bom... Mas porque o medo?


- Lourival, ‘cê ainda não viu que o Tácio tá com medo da Alzirinha? Se o moleque é o maior caguete, é claro que ele vai bater pra mãe! – ressaltou Antoninho, até então quieto.


Estácio teimava em negar, mas estava nítido que era medo de Juninho (ou Tacinho, como queiram) descobrí-lo ali. Medo concreto, aparente, de quem é submisso da mulher. Seus amigos zombavam, pois Estácio, na época do colégio, era o mais assediado do grupo. Segundo contam, tinha até um certo charme, mas não era um Don Juan.


- Que foi que aconteceu com o galã do Assaré? Virou cachorrinho de madama, é? – zombava Zé Pinguela.


- Que nada! Alzira virou a "peã boiadeira" e laçou o touro bravo. Aproveitou pra castrar ele e fazer dele um boi. Tadinho dele! – Antoninho voltou a zombar


E o nosso herói lá, calado na dele. Até que surge um menininho por trás de Antoninho, cutucando-o.


- Paiê, a mãe perguntou cadê o refri do almoço que o senhor falou que ia levar e até agora não apareceu?


- Manda ela pro raio que o parta, Gabriel, pô! Você não tá vendo que eu tô aqui conversando com o pessoal?


- Que que eu falo pra ela então?


- E então, Antônio, que que você fala pra sua mulher? Diz pro garoto! – desafiava Estácio.


- Deixa quieto! Fala que já tô indo!


A gargalhada foi geral. Antoninho, que tanto pregara a superioridade masculina, era um "pau-mandado" de sua esposa. Retirou-se da mesa e foi ao encontro de sua mulher. Logo depois Gabriel volta com um recado de Antoninho:


- O pai pediu pra avisar que não vai dar pra ele voltar não.


- Por quê? Tua mãe tá batendo muito nele? – perguntou Lourival.


- Inda não, mas tá falando pra caramba!!


Nova gargalhada na mesa do bar. Envolto na gargalhada e na conversa, Estácio nem percebe a aproximação de Juninho, que o cutuca por trás.


- Ué, pai, o senhor não disse que ia comprar o cigarro?


- E agora, Tácio, como é que você fica? – zomba Lourival, que não percebe que Dinorá, sua esposa, que chega por trás dele e berra:


- LÔ-RI-VAL!!!! Que que tu tá fazendo aqui, traste? Tu não ia comprar o cano pra consertar o encanamento da cozinha?


- Hein?! Que que você dizia, Lourival? – zombava Estácio.


- Psiu... Cala a boca! – sussurrava Lourival.


- Então, Lourival, vai me responder ou não?


- Dinorazinha...


- Dinorazinha é o cacete! Vambora agora! – e desceu o rolo de macarrão no pobre do Lourival. Estácio só ria da situação.


- E agora que vai me chamar de cagão, de "pau-mandado" de mulher? Todos nessa mesa tem um pé atrás quando se fala de mulher.


E a mesa aquietou-se, com a conversa tomando outros rumos. Desde aquele dia, ninguém se atreveu a discutir as atitudes familiares de cada em e nem zombar do outro por isso. Era permitido discutir de tudo, de política a futebol, menos de mulheres e família.


Antes que eu me esqueça, a alegria do nosso herói durou pouquíssimo. O filho realmente dedurou-o para a mãe, que foi buscá-lo no bar e levou-o debaixo de porrada. Mas naquela hora ninguem zombou, pois aconteceu com todos que lá estavam. Alguns revidaram, e foram denunciados por agressão às sua mulheres. Hoje, eles estão em cana.

sábado, 9 de maio de 2009

Um amor da família

- Acorda, moleque! Levanta pra vida, vagabundo!

Assim meu pai me acordava todas as manhãs. Em resposta, eu levantava resmungando.

- Tá reclamando de quê, vadio? Você não faz merda nenhuma pra ajudar em casa!

E eu ia para o banheiro, tomar um banho e sair para trabalhar. Para meu pai eu não era um trabalhador, eu era um imprestável que vivia em casa, à toa. Mas eu não ligava.

Um belo dia meu pai provocou-me de um modo digamos mais acintoso. Ele estava revoltado, pois havia perdido seu emprego no dia anterior e estava a ponto de matar minha mãe e eu.

- Seu filho da puta, levanta dessa cama que eu não suporto mais olhar para sua cara e nem da puta da sua mãe.

Naquela hora meu sangue subiu a cabeça. Virei-me em sua direção e fuzilei-lhe um olhar.

- Não me olha assim, não! Você é um desgraçado, inútil, filho da pior puta deste mundo, que cobra muito caro por uma trepada que acabou com a minha vida!

- Pra mim já chega! Já aturei coisa demais!

- O que é que você vai fazer, seu borrabotas?

- Isso, velho desgraçado! – e desferi-lhe um soco na cara. Caímos na porrada naquele exato momento. Findada a briga e vendo que havia levado a pior (eu era carateca e me preparava para campeonatos), meu pai me expulsou de casa. Eu saí indignado, minha mãe pedindo para que não fôsse, mas ela indo atrás de mim.

Fui embora. Bati na porta de um amigo, ele me deixou ficar em sua casa. Contei minha história, ele me apoiou. Vimos uns filmes pornôs que ele tinha em casa e bebemos durante aquela noite. Meu trabalho? Esqueci.

No dia seguinte, acordei e fui trabalhar. Que merda! Não tava a fim de ir trabalhar naquele dia. A ressaca tava forte. Mas fui assim mesmo. Quando cheguei lá, uma novidade: meu chefe tinha sido transferido pra outra cidade. No lugar dele, entrou uma mulher. Cara, que mulher! Morena, um metro e oitenta, corpaço em forma... em resumo, uma deusa de ébano. Toda a firma queria trepar com ela, e comigo não era diferente. Pena que ela não dava bola pra ninguém. Isso uma semana depois do porre.

Até que um dia ela me chamou na sala dela. Mostrou uma cadeira, pediu que eu sentasse. Logo imaginei que ela queria me mandar embora, pela semana que fiquei fora da firma, pra curar aquela ressaca. Tava preocupado pra cacete. Então ela começou a falar, e falar, eu nervoso pra caramba, até que ela me perguntou por que eu tinha começado a trabalhar ali Sabia que era minha chance de segurar o trabalho, por isso fui franco.

- Vim pra cá porque meu pai não vale nada, e eu queria ganhar meu próprio dinheiro e mostrar pra ele que não precisava ficar na dependência dele. Ainda bem que não moro mais com ele. O desgraçado me botou pra fora de casa feito um cachorro, depois da gente baixar na porrada um com o outro.

- Se ele é tão ruim assim, porque você não o mata?

- O quê!? Ficou maluca!?

- Talvez. Hoje eu acordei e decidi fazer tudo que me desse vontade. Eu queria Ter matado meu pai, mas um desgraçado tomou minha frente e matou-o primeiro. Se você quiser matar o seu, faça-o antes que outro o faça. Agora pode ir. Eu tinha te chamado pra te dar sua carta de demissão, mas mudei de idéia.

- Já que não vai me dar a carta de demissão, que tal o número do seu telefone?

- Aí, você já quer demais. – E soltou uma risadinha safada, como quem convida ao outro a fazer besteiras.

Passei o resto do dia encucado com minha chefe. Ela até me deu o número! Achei ela muito louca, mas continuei a trabalhar, pensando na ideia que ela me deu. Quando acabou meu expediente, fui a uma loja de armas e comprei uma doze com uma caixa de cartuchos. Passei na casa de meu colega, deixei minhas coisas e, decidido, fui para casa de meus pais.

Quando lá cheguei, entrei em casa sem bater. Minha mãe estava dormindo na sala com uma faca no chão. Eu imaginei o pior, mas a faca estava limpa. Ela devia ter feito algum lanche noturno. Fui para a cozinha, onde naquela hora eu sabia que ele estaria lá, mas achei ele decepado no chão. Dei um berro, ‘que merda!’, e ouvi minha mãe dizerque estava tudo bem. Ela havia matado ele. E eu, assim como a louca da minha chefe, me ferrei. A desgraçada da minha mãe matou ele primeiro.

Quanto a minha chefe, demos uma bela duma trepada e estamos juntos até hoje, pra inveja dos meus colegas de firma. É como dizem: quem não chora, não mama.