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domingo, 13 de setembro de 2009

Os filhos de dona Teresa

Essa é a história de dois irmãos que nunca se deram lá muito bem, apesar de virem do mesmo berço. Mas comecemos a história por dona Teresa Viana, mais conhecida por todos no bairro como dona TV. Ela chegou por lá em 1950, contam os mais antigos, acompanhada do marido Astor Chatieur, que ficaria conhecido por Chatô, um descendente de franceses com quem ela havia acabado de casar. Como o casal não era da localidade, sua chegada no bairro foi um tremendo alvoroço. Nunca alguém tão nobre punha os pés por aquelas bandas. A vizinhança se acostumava com o doutor Halbert Dionisius, mais conhecido por Dr. Rádio, na liderança do título de mais notório morador.

Os primeiros dias do casal foram de muita agitação. Logo, em 1953, nasceu o filho mais velho do casal, Ricardo. A alegria era radiante no bairro, pela criança ser o herdeiro dos novos nobres do lugar. Quando mais novo, não fedia nem cheirava, mas quando tinha 11 anos, a vida começou a mudar. Os pais trouxeram a vida mais um filho homem. Glauber nasceu em 1964, já em meio a ditadura militar imposta. Ricardo começou a ficar incomodado com as atenções voltadas ao irmão recém-nascido e, já no ano seguinte, começou a andar com companhias que seus pais reprovavam. Alguns moleques que circulavam no bairro, incomodados com a situação reinante, eram essas companhias. Gigi, Chibu, Velô, Relina, Gagá, Mumu, Betinha, entre outros mais, revoltavam a vizinhança, que em muitas das vezes só ficava aliviada quando a polícia chegava.

O tempo passava e Ricardo havia perdido o rancor que sentia por Glauber. Em 1968, com o pai já morto, Ricardo, então com 15 anos, já havia se infiltrado num grupo revolucionário, já sem a companhia dos outros, o que o fez ser preso. Glauber, com apenas 4 anos, não incomodava a mãe. Preferia passar o dia vendo a televisão e, quando saía, estava descobrindo o futebol. Enquanto o irmão estava engajado politicamente, Glauber só queria saber de bater bola.

A década de 1970 veio já com Copa do Mundo na televisão, para a alegria de Glauber e tristeza de seu irmão, que agonizava na cadeia sob torturas, mas resistia bravamente e não morria. Ricardo não queria saber de ver a Copa por causa das interferências políticas do governo na seleção de futebol. Para ele, e para muitos outros companheiros seus, ‘a seleção tinha mais é que perder aquela copa, pra acabar com a falsidade nacional’. Mas de nada adiantou, a seleção acabou levando a taça e ele continuou na prisão até o fim da década. Enquanto isso, Glauber se destacava entre os vizinhos, que se espantavam como o mesmo ventre abrigou alguém tão puro como Glauber e tão perverso como Ricardo. Mas o tempo passava.

No início da década de 1980 Glauber se mostrava um garoto prodígio. Às vesperas de completar 20 anos, já estava ligado a gente importante que era inclusive do primeiro escalão governamental. Para desespero de Ricardo, que lutava para conseguir um novo emprego do auge de seus quase 30 anos e esbarrava nas dificuldades existentes. Glauber, já no fim dessa década, estava consolidado entre seus contatos. Muitos deles haviam ficado para trás, tamanha a gana dele. Não encontrando a mesma sorte, Ricardo, desiludido, passou a frequentar uma igreja evangélica e, uma vez ordenado pastor, decidiu iniciar a própria seita. E o tempo continuava passando.

Duas personalidades tão diferentes não poderiam continuar coabitando no mesmo lugar. O sucesso de Glauber não influía mais no comportamento de Ricardo. Mas o crescimento desse começou a incomodar o daquele. Glauber nunca acreditou na conversa de que o irmão tinha capacidade para liderança, que ficava evidente quando víamos o crescimento absurdo daquela seita iniciada por Ricardo. Ricardo não ligava para essa desconfiança, mas se preocupou quando o irmão utilizou-se de sua influência para que fosse aberta uma investigação para apurar esse crescimento. Quando investigado, Ricardo acabou sendo preso sem provas de acusação. Mas não por muito tempo. Diante da falta de provas, o juiz encarregado do caso inocentou-o, e ele voltou a ficar no seu canto. Ricardo se orgulhava do crescimento da seita e Glauber estava mais forte do que nunca estivera. Suas influências agora estavam no poder e ele gozava de prestígio internacional. Mas ainda não estava satisfeito. Tinha que destruir o irmão a todo custo. No final daquela década utilizou-se mais uma vez das influências e conseguiu que o irmão fosse novamente investigado. Ricardo foi novamente inocentado e Glauber voltou a seu canto. Mas Ricardo não mais ficava calado. Havia feito algumas relações que o fortalecia, dizia que seu irmão era um infiel, por não acreditar que havia mudado e que a mãe devia estar se revirando no túmulo. O irmão é que se calara dessa vez.

Diante da calmaria que se instalou, Ricardo se arriscou no mesmo ramo de Glauber. Com o passar dos dias ele se consolidava como uma ameaça real ao império montado por Glauber. Tinha o mesmo prestígio, mesmas condições e tinha uma aliança forte. Ficaram assim até um tempo atrás, quando Glauber instigou um amigo a atacar o irmão. Aproveitando-se do ataque, que Glauber tornou mundial, Ricardo se apoiou novamente no seu discurso de fé. Sem se preocupar com a reputação do irmão, pôs às claras as relações escusas do irmão em rede nacional, como defesa.

Hoje, estão ambos numa guerra sem fim. Glauber, com 45 anos, optou pelo silêncio e não procura o irmão para uma possível reconciliação. Ricardo, com 56, continua a atacar o irmão e a se preocupar com o seu crescimento. Quem os conhece duvida quando sabe que tiveram a mesma origem e se perguntam como seria possível dois irmãos serem tão diferentes tendo praticamente a mesma origem. Quem souber que nos responda.

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